livros, Quadrinhos

O Perfuraneve, Jacques Lob, Benjamin Legrand e Jean-Marc Rochette

“Nesta viagem sem remissão, todos seguem a mesma destinação, mas alguns deles já chegaram a essa estação que se chama eternidade”

Em um futuro distante, após uma hecatombe nuclear, que deixou o mundo inabitável, o que restou da humanidade passou a viver dentro de um trem, chamado O Perfuraneve

A ideia era começar de novo, mas a vida no Perfuraneve acaba se tornando extremamente parecida com a vida fora dele. O trem se divide entre os mais ricos e os mais pobres, com os mais ricos vivendo no começo do trem em boas condições e os mais pobres, amontoados e passando fome no fundo do trem. O racismo e a religião, muitas vezes exagerada e extrema, ainda estão presentes.

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Originalmente, O Perfuraneve foi publicado em três partes: O Perfuraneve, O Explorador e a Travessia. Cada uma das partes conta uma história diferente, que em alguns casos, se passam até em épocas diferentes, mas que se relacionam em algum momento, seja em uma lembrança ou em uma referência. A primeira trama, justamente a que dá nome ao livro, é a mais interessante.

Certamente que O Perfuraneve tem uma trama muito criativa, mas por outro lado, até meio realista. No quadrinho, a terra não é mais habitável e vive mais uma era do gelo, os sobreviventes passam a viver em um trem que fica o tempo todo rodando. Como boa parte da literatura distopica, que pode ter parecido absurda na época em que foi escrita, hoje em dia já não soa mais tão absurda.

Mas mais interessante do que isso é ver como as pessoas se organizam dentro do trem. Na teoria, o Perfuraneve seria uma ótima forma de começar a sociedade de novo e repensar os erros que fizeram com que o mundo sucumbisse, mas os habitantes do trem fazem exatamente o contrário e continuam repetindo os comportamentos que tinham antes. Então, os preconceitos de vários tipos, ainda estão presentes, assim como a alienação por parte dos que comandam.

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Como em toda a situação de desespero, as pessoas se voltam para forças maiores e a religião também é algo comum no Perfuraneve. O trem tem seus profetas e seus seguidores, que podem facilmente ser comparados tanto com fieis de igrejas tradicionais, como com seguidores de seitas.

Outra coisa que se repete são as questões sociais, as pessoas mais ricas vivem em boas condições na parte da frente do Perfuraneve, com suas próprias acomodações privadas, comida e até um cinema, já os mais pobres, vivem no fundo do trem, sem qualquer privacidade ou conforto e muitas vezes, até sem comida, levando eles a se alimentarem de ratos que aparecem no trem. Embora todo mundo saiba como é a vida no começo do trem, os ricos não têm conhecimento total sobre o que acontece na parte de trás do trem.

É dessa maneira que o livro acaba falando muito mais sobre a sociedade em que vivemos do que sobre a sociedade aonde a trama se passa. O que fica claro após a leitura de O Perfuraneve é que mesmo que tenha a chance de mudar, a sociedade tem a tendência a repetir os mesmos padrões.

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Essa questão é muito abordada na primeira parte do livro, as histórias da segunda e terceira parte são mais focadas nas consequências do que aconteceu na primeira trama. Como uma obra só, tudo se completa e é muito poderoso.

O Perfuraneve não é um quadrinho alegre, nem na sua trama, nem na sua estética. Os desenhos, embora sejam detalhados e bem feitos, são escuros e o quadrinho inteiro é em preto e branco. Essa escolha combina muito com a história que o quadrinho quer contar.

A edição da Aleph é, como sempre, muito cuidadosa e cheia de detalhes. O livro é consideravelmente maior que um livro comum e tem uma edição linda. A qualidade da edição é inquestionável, a folha utilizada é mais grossa dos que a usada em outros livros e é perfeita para um quadrinho.

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É bom ressaltar também que a edição da Aleph vem com as três partes de O Perfuraneve, o que é ótimo. No final, também tem um posfácio que fala sobre como o quadrinho foi criado, escrito e publicado, desde a concepção da história, até os desenhos, que também dá ao leitor uma visão interessante e diferente da obra.

O Perfuraneve é uma obra linda, com um cuidado primoroso, que fala sobre a sociedade e sobre o comportamento das pessoas não importa o lugar aonde elas estejam.

Título no Brasil: O Perfuraneve

Título original: Le Transperceneige : Intégrale

Autores: Jacques Lob, Benjamin Legrand e Jean-Marc Rochette

Gênero: Quadrinho, HQ, Ficção científica, Distopia

Ano de lançamento: 1984

Editora: Editora Aleph

Número de Páginas: 280

Fotos: Fernanda Cavalcanti

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