“Tinha a ver com dizer que tudo bem ser amadorístico e engraçado, que a verdadeira criatividade vinha de se fazer lambança; tinha a ver com trabalhar com o que você tinha na sua frente e transformar tudo de embaraçoso, medonho e estupido da sua vida em pontos fortes”- Legs McNeil
Mate-me Por Favor acompanha o nascimento, o auge e o fim do movimento punk. O livro começa na Factory, de Andy Warhol e chega até os anos 80, explicando o cenário político do período, os gêneros musicais que evoluíram para o punk, os acontecimentos que marcaram o movimento e falando das pessoas que foram importantes para que o punk ganhasse forma.
Mate-me Por Favor parte de uma premissa relativamente simples. O livro tem como intenção explicar toda a história do movimento punk, desde antes do seu nascimento, até depois do seu final.
Se a premissa é simples, o trabalho é o exato oposto. Mate-me Por Favor cobre em torno de trinta anos de história da música, uma vez que começa nos anos 60 e chega a década de 80. O livro fala sobre outros gêneros musicais, como o glam rock, que eventualmente, levaram ao movimento punk e a música punk.
Mate-me Por Favor não tem um texto corrente, ele é dividido com as falas de diversas pessoas que fizeram parte do movimento ou que viveram na época. Entre essas pessoas estão Iggy Pop, Lou Reed, Debbie Harry, Bebe Buell, Dee Dee Ramone, Joey Ramone, Patti Smith e Nico.
Essa técnica faz o leitor ter a sensação de que está assistindo um documentário, e que a cada minuto uma pessoa diferente dá a sua opinião. Muitas vezes essas opiniões divergem e pessoas diferentes contam versões diferentes da mesma história e o leitor tem acesso a todas essas outras versões.
Por outro lado, algumas vezes é difícil acompanhar e entender quem está falando ou mesmo quem é quem, uma vez que o livro apresenta personagens muito famosos e personagens não tão conhecidos. Isso acontece especialmente, se o leitor não sabe tanto sobre a história do punk ou da música de uma maneira geral.
Não que seja impossível entender o livro se você não conhece muito do movimento em questão – eu mesma sabia pouquíssimo sobre o assunto – mas talvez a leitura exija um pouco mais do leitor que sabe menos, mas uma das grandes vantagens do livro é sair da leitura, sabendo mais.
Mate-me Por Favor se divide entre narrar os avanços do movimento punk e toda a mudança de comportamento que veio com ele e falar sobre as festas e as vidas privadas dos participantes do movimento, por isso, ele tem momentos seríssimos, que fala sobre toda a questão de rebeldia juvenil, e da onde vinha o sentimento de raiva comum a todo adolescente, que nesse caso, criou o punk, e momentos que soam quase como uma revista de fofoca, onde ele revela preferências sexuais, romances, casos, ficadas e quem usou droga com quem.
Essa segunda parte pode aborrecer quem está interessado só nas questões que dizem respeito ao movimento, mas na realidade, até as informações que soam como fofoca são interessantes e deixam o leitor muito curioso. Algumas das histórias que são contadas, são tão malucas e tão surreais, que deixam o leitor de boca aberta.
Mate-me Por Favor é um livro de história, que retrata uma história bem recente e que talvez não interesse todos, mas que a sua maneira, fala sobre um período e automaticamente fala sobre o comportamento da juventude nesse período. A análise desse comportamento juvenil, que geralmente acompanha todo e qualquer fenômeno adolescente, é muito interessante de ser feita.
O livro tem um problema, que talvez não seja exclusivo da publicação. Existe pouquíssima participação feminina no livro, boa parte das mulheres que dão entrevistas para o livro são groupies e não eram artistas que faziam parte do movimento. Claro que as groupies também fazem parte do movimento e não é razoável dizer que o papel delas é menor em tudo que se desenvolveu, ou desmerecer essas mulheres e suas escolhas – as groupies são de fato, uma parte importante de boa parte dos estilos musicais – mas poucas mulheres falam sobre o desenvolvimento do movimento, uma vez que as groupies falam mais das questões pessoais. Entre essas mulheres estão Patti Smith, Debbie Harry e Nico, mas essa última é sempre pintada como “promiscua” pelos homens que aparecem no livro, com frases como “todo mundo dormiu com Nico” e “Nico estava sempre atrás de alguém”.
Soa quase irreal – e até meio entediante – que o movimento punk tenha sido feito quase que exclusivamente por homens, e parece que o livro não leva as mulheres que participaram do movimento muito a sério, uma vez que só da voz a Smith e Harry e retrata Nico como “alguém que dormia com todo mundo” – como se todos os homens do livro também não estivessem “dormindo com todo mundo” – e outras mulheres como Nancy Spungen como uma viciada de quem ninguém queria ficar perto.
É difícil dizer, no entanto, se o livro que adota essa postura ligeiramente machista, se o movimento punk era machista ou se as mulheres dessa época se contentavam em ser groupies, o que já era bastante para época, uma vez que a groupie tem uma total e completa liberdade sexual e isso nos anos 70, já é bastante coisa.
A leitura de Mata-me Por Favor é muito fácil e muito tranquila, o livro é bem grande (544 páginas, mas é uma versão de bolso), mas ele prende o leitor e faz com que ele queira saber cada vez mais, por isso, a leitura se torna rápida. É muito legal ler sobre pessoas famosas e ler pessoas famosas falando sobre o movimento, porque nos sentimos dentro de toda aquela história.
Mate-me Por Favor é um livro que fala sobre o movimento punk e tudo que ele mudou, por isso, parece natural que quem se interessa pelo assunto vá gostar mais do livro, mas ele também pode agradar quem gosta de música e de história da música e também quem gosta de algumas das pessoas que são citadas no livro.
Mate-me Por Favor acompanha uma parte importante da história da música e também do mundo, quando ele mistura fatos históricos, com fofocas suculentas, ele se torna acessível a quase todo tipo de público e é uma boa diversão, com muito conhecimento.
Título no Brasil: Mate-me Por Favor
Título original: Please Kill Me
Autores: Gillian Mccain, Legs Mcneil
Tradução: Lúcia Brito
Gênero: Música, História, Biografia, Sociologia
Ano de lançamento: 1996
Editora: L&PM
Número de Páginas: 544
Foto: Fernanda Cavalcanti
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