“Só sei que isso é o que me faz sentir…sabe…eu, sabe quando você trabalha ou vai à escola e repete as mesmas coisas todos os dias? Vai trabalhar, volta para casa, come, lava a roupa suja. Vai dormir. E de repente percebe que os dias estão passando muito depressa. E que começam a ficar iguais. E daí começa a sentir que não pode ser assim. Não pode ser só isso. Isso não pode ser…sabe…a vida. Tem que haver mais. É isso que escalar representa para mim. É o mais. Aquela coisa que me faz sentir que a vida é suficiente. Eu sei que está entendendo, August. O que faz a sua vida parecer suficiente?”.
Todos os anos, August Shroeder, um professor de ciências que luta com o alcoolismo e perdeu a fé na vida, viaja de trailer pelas estradas dos Estados Unidos. Nesse ano, ele pretendia visitar o Parque Nacional Yellowstone com seu filho, Phillip, mas Phillip faleceu em um acidente de carro e August manteve seus planos mesmo assim, com a intenção de espalhar as cinzas do filho pelos lugares em que passa.
Antes da viagem começar, no entanto, o trailer de August quebra e ele acaba em uma oficina mecânica, onde o dono lhe faz uma proposta estranha: que August leve os dois filhos do homem, Seth e Henry, com ele na viagem, já que o homem vai ficar um tempo preso e não tem ninguém para cuidar dos meninos.
August acaba topando e os três se veem realizando uma viagem por paisagens maravilhosas, enquanto lidam com luto, medo, perdas, conquistas e transformações.
A trama de Leve-me Com Você começa rápida e até um pouco confusa, mas vai aos poucos se explicando. O livro é narrado do ponto de vista de August, que já está a caminho do Parque Nacional Yellowstone, o leitor percebe que ele é um homem triste, desanimado e sem qualquer fé na vida, mas não sabe exatamente o que lhe aconteceu. Quando August chega na oficina e recebe a proposta de levar Seth e Henry na viagem, as coisas começam a fazer um pouco de sentido.
Lógico que no começo a proposta do pai dos meninos soa absurda não só para August, mas também para os leitores e se pensarmos em questões realistas, ela de fato é, afinal, esse homem está largando seus filhos com um homem que ele não conhece e do qual não sabe nada, mas essa é uma questão que acaba ficando de lado quando entendemos e absorvemos outras questões que o livro traz.
Leve-me Com Você só engata quando August, Seth e Henry colocam o pé na estrada e se veem os três em uma viagem maluca e ainda assim, bonita. August é um homem cheio de magoas e feridas e o leitor percebe que ele está triste, mas só descobre sobre a morte de seu filho e sobre a sua intenção de espalhar as cinzas do rapaz ao longo da viagem, com o tempo. Ele é um pai de luto, que vem lutando com o alcoolismo, mas ainda assim se mantém gentil, tanto que topa levar duas crianças que ele não conhece com ele.
Já Seth, o menino mais velho, é um jovem acostumado a tomar decisões e cuidar de si mesmo e de seu irmão, por isso, é extremamente responsável e muitas vezes se comporta como um adulto, como acontece com frequência com crianças que tem pais não muito responsáveis. E Henry, o irmão mais novo, é tímido e quase nunca fala, o pai dos meninos nem sabe dizer se ele se comunica com o irmão mais velho.
Os três se unem quase como uma família estranha e disfuncional, e precisam se acostumar um com o outro. Seth, que nunca tinha saído de casa antes, está empolgado e faz perguntas o tempo todo, mas sempre pergunta a August se o está incomodando, até que ele começa a aprender que ele não incomoda o homem e que o barulho dos meninos – Henry pouco a pouco começa a falar – é até bom para ele, que sente falta de seu filho e que tinha planejado fazer essa viagem com Phillip.
Assim que a trama de Leve-me Com Você é dada fica até um pouco óbvio o que vai acontecer: August, que perdeu um filho, vai começar a ver os meninos como seus filhos e Seth e Henry, que tem um pai em quem não podem confiar, vão começar a ver August como uma figura paterna e é exatamente isso que acontece, no entanto, o fato do leitor já supor o caminho que a obra vai tomar não atrapalha em nada sua leitura e nem a graça do livro, porque a questão é como isso acontece e o que esses três personagens aprendem no meio do caminho.
August também é um alcoólatra em recuperação, que frequenta a reunião dos Alcoólatras Anônimos inclusive quando está na estrada e Seth reconhece que seu pai também é alcoólatra e que muitos dos problemas que a família enfrenta e enfrentou são derivados do alcoolismo do pai. Quando o menino começa a ir nas reuniões com August, ele também aprende sobre seu próprio pai.
Ao mesmo tempo que eles viajam por uma série de paisagens dos Estados Unidos, que são descritas com maestria por Catherine Ryan Hyde, e August, que é professor de ciências dá aulas para os meninos, eles também aprendem sobre a vida, e lidam com o luto do qual os três sofrem, embora de maneiras muito diferentes.
A história de Leve-me Com Você é muito bonita e mesmo com os vários aspectos tristes, ela é, em sua maioria, alegre e repleta de bons momentos. O livro tem tanto conteúdo e é tão bem escrito, que a pequena incongruência do começo não incomoda o leitor, que entende que essa viagem só seria possível com essa pequena irrealidade.
A leitura é rápida, mas extremamente proveitosa, o livro é muito bem escrito e embora ele seja extenso, o leitor lê rápida e de maneira prazerosa. Na parte estética, Leve-me Com Você, é lindo, tem capa dura e muitos cuidados que já são comuns as edições da DarkSide Books.
Leve-me Com Você é uma história sobre família e sobre como elas se relacionam, mesmo que não retrate uma família de sangue, o livro prova que muitas vezes, buscamos pais e mães fora de casa, ao mesmo tempo que ensina sobre a vida, sobre o luto e a perda.
Título no Brasil: Leve-me Com Você
Título Original: Take Me with You
Autora: Catherine Ryan Hyde
Tradução: Débora Isidoro
Gênero: Contemporâneo
Ano de lançamento: 2014
Editora: DarkSide Books
Número de Páginas: 336
Foto: Fernanda Cavalcanti
Um comentário em “Leve-me Com Você, Catherine Ryan Hyde”