Adaptações, filmes

Filme: Grandes Esperanças, 1946

Pip Pirrip (nessa fase interpretado por Anthony Wager) é um órfão que vive com sua irmã (Freda Jackson) e seu cunhado (Bernard Miles) em uma casa humilde. Ainda criança, Pip cruza com um prisioneiro (Finlay Currie), que acabou de fugir da prisão, e o ajuda, ficando marcado pela vida toda.

Logo depois, ele é convidado pela Srta. Havisham (Martita Hunt), uma mulher excêntrica que não sai de casa, a passar um tempo com ela, na sua mansão. Lá Pip conhece Estella (nessa fase interpretada por Jean Simmons), a filha adotiva da mulher, que o trata mal, mas por quem ele se apaixona mesmo assim.

Pip continua seu serviço na casa da Srta. Havisham até os quatorze anos, quando deve começar seu treinamento como ferreiro, com seu cunhado Joe, mas então, o destino de Pip muda e um anônimo resolve pagar pelos estudos dele. Pip (nessa fase interpretado por John Mills) se muda para Londres e começa a se tornar um cavalheiro, sem jamais esquecer de Estella.

Grandes Esperanças é inspirado no livro de mesmo nome de Charles Dickens.

A trama de Grandes Esperanças circula ao redor de Pip e acompanha toda a vida dele, o filme, inclusive, tem uma narração em voz over, do próprio Pip, que também narra o livro. Pip é um personagem que muda muito, ele começa como um garoto pobre e órfão, cuja única possibilidade de futuro é se tornar ferreiro, como seu cunhado, mas as pessoas que ele encontra pelo caminho e as decisões que ele toma, fazem com que ele mesmo consiga mudar seu destino.

Quando Pip é convidado a passar as tardes com a Srta. Havisham, ele tem acesso ao mundo dos ricos, algo que ele nunca conheceu antes, mas ao mesmo tempo precisa suportar uma série de humilhações, tanto de Estella, que o trata mal e o subjuga, quanto da dona da casa, que parece se divertir com o que a protegida faz.

Mas o destino de Pip só muda realmente quando alguém decide pagar pelos seus estudos e ele passa a ter a chance de se tornar um cavalheiro. Pip se muda para Londres e começa a aprender, quando ele reencontra Estella (nessa fase interpretada por Valerie Hobson), ele passa a manter uma esperança de que os dois possam se casar um dia, mas ele também começa a ficar um pouco esnobe e a esquecer de onde veio.

Grandes Esperanças segue a jornada de Pip e todas essas mudanças, como acompanhamos Pip desde que ele é uma criança, é fácil se afeiçoar do personagem e torcer por ele ou eventualmente se decepcionar com algumas das suas ações. A história é completamente narrada do ponto de vista do personagem, por isso, a audiência acredita no que ele acredita, o que no final, pode nos levar a algumas surpresas.

Outra questão bem importante em Grandes Esperanças é a relação de Pip e Estella. Os dois se conhecem quando crianças e Pip quase que automaticamente se apaixona por ela, mas Estella é mimada e grosseira e parece desprezar Pip.

Estella é de fato, uma personagem difícil de engolir, mas ela também é muito bem construída. Quando criança ela se porta de maneira deliberadamente cruel, humilhando Pip sempre que pode, ao mesmo tempo que lhe dá esperanças sobre um possível relacionamento entre os dois, quando ela reaparece na vida de Pip, já adulta, ela já percebe que é incapaz de amar qualquer pessoa e fala isso para Pip com todas as letras, o desencorajando a manter esperanças em relação a ela, mas ela já não é mais cruel, como se tivesse compreendido sua natureza.

Curiosamente tudo que Estella faz parece ser aprovada pela Srta. Havisham, que logo que apresenta Pip para Estella, comenta com a menina: “Você pode partir o coração dele”. Isso acontece porque Estella foi criada pela Srta. Havisham para ser cruel e para nunca se apaixonar, então, ela e Pip são personagens opostos, já que ele se apaixona por ela assim que a vê pela primeira vez e ela, evita a toda custo se apaixonar, acreditando que “não tem coração”.

Mas Grandes Esperanças é uma história cheia de camadas, e com muitos personagens. Pip e Estella podem ser os personagens que mais chamam atenção, mas existe todo um universo ao redor deles.

O filme aborda essas questões com menos atenção que o livro, que tem mais tempo para tal, mas ainda faz um aceno a aspectos para além da vida do protagonista. O fugitivo que Pip encontra e ajuda logo no começo do filme pode parecer até um ponto solto na trama, mas tem uma serventia muito importante que só é revelada bem mais tarde.

Já a Srta. Havisham, que tem a fama de ser uma mulher maluca, que nunca sai de casa e nem abre as janelas, ganha uma interpretação um pouco mais gentil quando Pip a conhece de perto. Ela é sim, uma mulher excêntrica, com um passado trágico e com uma personalidade machucada, que a torna cruel, mas ela também é uma mulher solitária e triste.

O interessante de Grandes Esperanças é que a história é muito bem amarrada e que mesmo que todas essas tramas pareçam não se relacionar, elas se unem em determinado momento de uma maneira que não soa forçada ou absurda.

Levando em conta que o filme é uma adaptação do livro de Charles Dickens, é importante ressaltar que o longa é bem fiel a obra original, a história foi, naturalmente, condensada, mas tudo que é importante na trama, está presente aqui. Claro que isso torna o filme um tanto quanto longo, mas ele não é cansativo e isso acontece porque a história é realmente muito instigante e porque Pip é um personagem muito carismático.

No entanto, o filme – como o livro – é mais interessante quando Pip e Estella são crianças. Na fase em que Pip está adulto, a presença de Estella é capaz de movimentar bastante a trama, mas a relação das duas crianças ainda é mais prazerosa de se acompanhar.

Isso pode acontecer porque as crianças que interpretam Pip e Estella nessa fase estão ótimas no papel, Jean Simmons, que interpreta Estella quando criança é ótima e consegue entregar uma personagem que é cruel e terrível, mas de quem ainda gostamos e Anthony Wager, que interpreta Pip quando criança, faz com que a plateia goste e sinta pena daquele personagem e assim, passe a torcer por Pip. John Mills, que interpreta Pip na fase adulta não é nem tão carismático e nem parece ter a idade certa para o papel, o que tira um pouco do encanto do personagem.

A caracterização dos personagens é eficiente, mas não chama a atenção especialmente, embora todos eles usem roupas que condizem com a época em que o filme se passa e que fazem sentido dentro da personalidade e das classes sociais de seus personagens, não tem nenhuma roupa memorável no filme. A ambientação é mais cuidadosa, o filme brinca muito com o gênero do terror e é cheio de cenas com sombras e com efeitos comuns a esse tipo de filme, a mansão da Srta. Havisham, por exemplo, é escura, fria, soturna, suja e malcuidada, e a visão da mesa, cheia de comida e infestada de teias de aranha que a mulher mantém, é de arrepiar. O fugitivo é outro personagem que é sempre apresentado como uma criatura assustadora, sempre escondido nas sombras, com roupas escuras e acompanhado de uma música sinistra de fundo, o que bagunça a nossa percepção do personagem e da história, mas de uma boa maneira.

Grandes Esperanças é uma ótima adaptação da obra de Dickens, que se mantém fiel ao trabalho original e consegue contar uma jornada de vida sem se tornar cansativa.

Título no Brasil: Grandes Esperanças

Título original: Great Expectations

Direção: David Lean

Gênero: Drama, Romance

Nacionalidade: Reino Unido

Ano: 1946

Duração: 1h 58min

Elenco: John Mills, Anthony Wager, Valerie Hobson, Jean Simmons, Bernard Miles

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