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A Trégua, Mario Benedetti

Martín Santomé é um viúvo prestes a completar cinquenta anos, que conta os dias para se aposentar, mas que não tem a menor ideia do que vai fazer depois que não precisar mais trabalhar. Ele é pai de três filhos, mas não se dá bem com nenhum deles, e a vida dele é monótona e sem graça, até que ele conhece Laura Avellaneda, uma de suas subordinadas no trabalho, por quem ele se apaixona.

Martín então, resolve viver o amor mais uma vez.

A Trégua é escrito em forma de diário e o leitor lê as anotações de Martín, que são inclusive datadas. A mudança no tom de voz do protagonista se dá através das próprias palavras dele, no começo do livro, ele apenas narra seu dia a dia, que é monótono e fala basicamente sobre sua preocupação em se aposentar, Martín também conta sobre sua falecida esposa e sobre os três filhos, Esteban, Blanca e Jaime, mas depois que Martín conhece Laura, a narrativa muda significativamente e acompanhamos o casal se apaixonar. A relação dele com Laura também é esmiuçada e ele passa a escrever cada vez mais, como se Laura tivesse lhe dado mais um estimulo para a vida.

Claro que como lemos o livro do ponto de vista de Martín e mais ainda de suas próprias anotações, seguimos a história do ponto de vista dele e sabemos das opiniões de Laura ou dos filhos de Martín e até mesmo de Isabel, a esposa falecida de Martín, a partir do que ele nos conta.

A ideia de A Trégua é narrar a vida desse homem que, aparentemente, não tem muito mais o que fazer na vida, o livro foi publicado em 1960, então, faz sentido pensar que um homem que vai completar cinquenta anos é um homem velho, que não tem mais nada a entregar ao mundo, hoje em dia, obviamente, essa perspectiva soa absurda. O grande ponto de virada de A Trégua é justamente o romance de Martín com Laura, uma mulher muito mais nova, que o faz gostar da vida novamente e que parece tão apaixonada por ele quanto ele está por ela.

Não existem muitos conflitos em A Trégua, isso porque Martín conhece e se apaixona por Laura e é correspondido e embora ele reclame o tempo todo em seu diário, nem seus filhos criam qualquer obstáculo para a relação, Blanca fica até amiga de Laura, já que as duas tem idades bem próximas. Nesse sentido, o livro pode ficar um pouco parado, mas A Trégua não é uma obra chata, já que lemos os pensamentos e anotações de Martín, que são em alguns aspectos, interessantes.

Mas tem um problema muito grande com o protagonista, que faz com que o livro se torne consideravelmente menos prazeroso, Martín é muito homofóbico e muito machista. Tudo bem que o livro foi publicado nos anos 60 e que ele parece um personagem realista para a sua época, mas outros personagens da trama expressam opiniões mais razoáveis sobre essas questões, como Jaime, que se assume gay e com quem Martín para de falar, e Laura, que tem um discurso feminista, do qual Martín zomba o tempo todo.

Seria interessante se Martín passasse por um processo de mudança, onde através de Laura e Jaime, ele aprendesse e se tornasse uma pessoa melhor, que não fala uma série de absurdos, mas não é isso que acontece, então, o leitor fica sem entender qual é o propósito de o personagem ser dessa maneira. Mostrar os costumes da época? Fazer o leitor consciente detestar o protagonista? O fato de outros personagens terem opiniões razoáveis e até bem atuais sobre esses assuntos, faz com que se entende que o autor não pensava como seu personagem, ainda que tenha vivido na mesma época que Martín, mas então porque criar e manter um personagem que é abertamente homofóbico e machista e que diz absurdos – como “prefiro um filho morto, do que um filho gay” – sem que ele sofra uma mudança no caminho? De uma forma ou de outra, essa questão já não cai bem nos dias de hoje e é muito difícil gostar de um personagem que fala o que Martín fala.

A leitura de A Trégua é rápida e bem prazerosa, Mario Benedetti escreve muito bem e mesmo que Martín seja um personagem difícil de engolir, suas anotações são bem interessantes e a leitura é bem fácil, o livro também é bem curto.

A Trégua é certamente um livro que reflete a sua época, ainda que tenha personagens modernos e atuais, que entretém, mas com o qual é difícil se conectar, já que o protagonista e narrador é uma pessoa desagradável e de quem é muito difícil gostar.

Título no Brasil: A Trégua

Título original: La tregua

Autor: Mario Benedetti

Tradução: Joana Angelica D’Avila Melo

Gênero: Clássico, Romance

Ano de lançamento: 1960

Editora: Alfaguara

Número de Páginas: 180

Foto: Fernanda Cavalcanti

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