Adaptações, filmes

Filme: Pinóquio por Guillermo del Toro, 2022

Depois que seu filho, Carlo (voz de Gregory Mann), morre em um bombardeio, Geppetto (voz de David Bradley) fica deprimido e recorre a bebida. Vinte anos depois, no entanto, ele cria um boneco de madeira, a quem batiza de Pinóquio (também dublado por Gregory Mann). Pinóquio ganha vida depois de uma visita de uma fada (voz de Tilda Swinton), que lhe concede o poder de andar e falar.

Geppetto a princípio se assusta e fica com medo de ser julgado pelos outros moradores da cidade, mas com o tempo ele passa a tratar Pinóquio como um filho, querendo que ele substitua Carlos. Pinóquio resolve que vai se comportar como um menino de verdade para deixar seu pai orgulhoso, mas ele encontra uma série de dificuldades no caminho.

Pinóquio por Guillermo del Toro é inspirado no livro As Aventuras de Pinóquio, de Carlo Collodi.

Uma adaptação sombria

Claro que Pinóquio por Guillermo del Toro tem como base o livro de Collodi, que já inspirou uma série de outras adaptações e releituras, mas a ideia aqui é transformar a trama, que tem ares de contos de fadas, em uma versão um pouco mais sombria e até realista, o que coloca o longa dentro do subgênero do realismo mágico.

O filme começa na época da primeira guerra mundial, e é justamente um bombardeio que mata Carlo, o filho de Geppetto dentro de uma igreja. Geppetto, que até aquele momento era um artista conceituado em sua pequena cidade, entra em um luto terrível, acompanhando de uma depressão profunda e se torna alcoólatra, ele para de trabalhar e passa os dias vagando no cemitério. A maneira com que Geppeto reage a perda do filho é bem mais pesada do que nas versões fantásticas da Disney, onde ele simplesmente talha o boneco, e bem mais realista.

Depois que Pinóquio ganha vida, a relação dos dois também não é perfeita. Geppetto naturalmente toma Pinóquio por um artefato amaldiçoado e teme que o resto da cidade pense o mesmo, ele não quer ser pai do boneco e o tranca no armário. O boneco escapa e aparece na igreja no meio de uma missa, causando um alvoroço na cidade e revoltando o Podestà (voz de Ron Perlman), um membro do governo autoritário, que flerta com o fascismo e que depois que descobre que Pinóquio não pode morrer, resolve mandá-lo para o exército.

Aliais, essa é outra questão que é mais pesada que a do livro, o tempo que Pinóquio passa treinando para ir para a guerra é uma releitura da ilha dos prazeres, mas aqui não existe nada de bom no período em que ele passa no exército.  

Além disso, Pinóquio por Guillermo del Toro tem uma forte subtrama política.

Um conto de fadas político

A ideia de misturar fantasia com política e com acontecimentos reais marca o trabalho de Guillermo del Toro, o exemplo mais famoso, e talvez o mais bem sucedido, é o filme O Labirinto do Fauno, que acompanha uma menina vivendo na Espanha dos anos 40, que encontra um labirinto no jardim de sua casa. Ao mesmo tempo que a menina mergulha no labirinto, os militares, aqui representados pelo padrasto da menina, perseguem os guerrilheiros e uma realidade espelha a outra, com direito a uma criatura terrível chamada Homem Pálido que é uma representação do patriarcado, porque como o próprio diretor diz, ele é branco e é um homem. Pinóquio parte da mesma ideia.

O filme começa durante a primeira guerra mundial e é ela que mata Carlo, o filho de Geppetto e que, portanto, é responsável por toda a tragédia que se dá na vida do homem depois disso. Quando Geppetto cria Pinóquio, no entanto, já se passou um tempo e já estamos na época de Benito Mussolini. Pinóquio não só faz uma dança que é uma espécie de parodia ao ditador italiano, como também encontra com ele em determinado momento.

O Podestà por sua vez, é uma representação mais próxima do autoritarismo e do fascismo, ele manda na pequena cidade onde Geppetto e Pinóquio vivem e ele quem determina o destino do boneco – primeiro o Podestà amaldiçoa Pinóquio, julgando que ele é um objeto de feitiçaria, depois, ele diz que Pinóquio deve viver como qualquer outro garoto da cidade e ser um cidadão exemplar e mais tarde, decide que Pinóquio deve ir para o exército, já que ele nunca pode morrer e é, portanto, o soldado ideal. – .

O conceito é interessante justamente porque é bem-feito, o livro de Collodi não fala sobre política e foi publicado em 1883, bem antes do governo de Mussolini, mas é inteligente que del Toro consiga trazer essa trama digna de um conto de fada – que aqui tem tons bem sombrios – para a realidade e consiga falar não só do passado, mas também do presente.

Aspectos técnicos

O roteiro de Pinóquio por Guillermo del Toro é muito bem escrito e consegue circular entre elementos do livro, da realidade, do passado e do futuro, mas o filme tem muitos méritos técnicos também.

A animação é linda, e segue os tons sombrios da trama, e os dois elementos se complementam claro. O Pinóquio de del Toro é muito diferente da sua versão mais famosa, o Pinóquio da Disney, que é um boneco fofinho, esse aqui é quase um pedaço de galho, com detalhes, ele é bem mais primitivo. O longa também é mais escuro, mas tudo funciona muito bem.

Também é preciso ressaltar as boas dublagens, Ewan McGregor, David Bradley e Gregory Mann estão ótimos.

Pinóquio por Guillermo del Toro se alonga um pouco, mas é uma obra de arte, que deixa a versão live action da Disney, lançada também esse ano, no chinelo, é até injusto comparar uma com a outra, uma vez que a versão da Disney só repassa para a tela de cinema o que já vimos no desenho de 1940, enquanto a versão de del Toro sai do universo dos contos de fadas para falar diretamente com quem a assiste em 2022.

Título no Brasil: Pinóquio por Guillermo del Toro

Título original: Guillermo del Toro’s Pinocchio

Direção: Guillermo del Toro, Mark Gustafson

Gênero: Animação, Fantasia

Ano: 2022

Duração: 1h 57min

Elenco: Ewan McGregor, David Bradley, Gregory Mann, Burn Gorman, Ron Perlman

Distribuidora: Netflix

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